Na Odontologia, algumas parcerias são necessárias para que os tratamentos funcionem. É o caso na interação Periodontia e Ortodontia, principalmente nos adultos.
Entretanto, em Periodontia, não parece lógico iniciar qualquer outro tipo de tratamento eletivo se a inflamação periodontal não for resolvida primeiro. Menos ainda se a nova terapia for do tipo ortodôntica (e a inflamação persistir).
Se o paciente está com bráquetes e fios colocados, num ambiente saudável, o mínimo que pode acontecer é um aumento do volume de tecido gengival e os processos de aposição e remodelação óssea controlados. Anos de estudo comprovam essas observações.
Por outro lado, no estado periodontal inflamatório provocado por microrganismos e seus fatores de virulência (por exemplo, lipopolissacarídeos), o que vemos macroscopicamente é a destruição óssea refletida por um sistema imune direcionado. Ela fica pior pela mecânica ortodôntica.
Mesmo diante da informação acima, pouco se sabe como essa transdução de força ortodôntica, somada ao estado inflamatório, altera os mecanismos em níveis celulares.
Quando um estudo recente conseguiu coletar células-tronco do ligamento periodontal e do compartimento ósseo medular em pacientes periodontalmente doentes, que estiveram sob força de movimentação ortodôntica por 12 e 24 horas, ocorreu o esperado: os níveis de RANKL e RANKL/OPG (representantes da perda óssea) eram praticamente iguais nas células do ligamento periodontal, mas muito mais elevados nas células do compartimento ósseo, que também tinham os níveis de Runx2 e ALP reduzidos (representantes da formação óssea), indicando o efeito nocivo da força ortodôntica, mesmo que controlada e por um curto período de tempo.
Agora, atenção ortodontistas! Vejam o que a força ortodôntica aplicada em ratos com doença periodontal controlada faz: o produto foi um osso neoformado, porém menos denso (mais trabecular) e com menor resistência mecânica (ou seja, osteoporótico), e com a presença de TRAP (enzima indicadora de reabsorção óssea), confirmando que a força ortodôntica também exerce seu papel nas células inflamatórias da doença periodontal.
Possível explicação: na inflamação periodontal, o consumo de glicose (combustível celular) está maior. Não só a via da glicólise, mas também a da fosforilação oxidativa (OXPHOS), é ativada ao mesmo tempo. Pode isso? Foi a inflamação que fez! E o problema maior não está nas células do ligamento, mas sim, nas células ósseas.
Entretanto, a relação entre as duas vias é controlada por um terceiro mecanismo, chamado PGC1-alfa – lactato desidrogenase A (LDHA): ele inibe a OXPHOS (reabsorção óssea) e favorece a glicólise (formação óssea), contribuindo para a regeneração. Que célula formidável, não?
Entretanto, como as células estão distendidas (força ortodôntica), há uma perturbação no mecanismo PGC1-alfa – LDHA: o bloqueio de PGC1-alfa ocasiona um incentivo maior para a via da OXPHOS, gerando perda óssea.
Boa notícia! Se experimentalmente provocarmos a super expressão de PGC1-alfa, o controle do remodelamento ósseo é retomado.
E o outro lado desse terceiro mecanismo, a LDHA? Má notícia: para nossa surpresa, se cortamos a LDHA, eliminamos o efeito atenuador provocado pela super expressão de PGC1-alfa. Ou seja, perdemos todo o osso que foi recuperado.
No final das contas, parece que a LDHA é a “verdadeira motivadora” dessa parceria com a PGC1-alfa, aquela que não deixa a peteca cair, que está sempre ao seu lado nos momentos difíceis. E mesmo que PGC1-alfa trabalhe dobrado, não há consistência no alívio da reabsorção se a LDHA não retornar nessa parceria. Mas isto ainda tem que ser confirmado com mais estudos.
Até aqui, o resumo é: PGC1-alfa e LDHA precisam ficar conectadas para que prevaleça a via da glicólise, e não a via da OXPHOS, nesse ambiente complicado de inflamação periodontal sob força ortodôntica.
Todo cuidado é pouco com a ortodontia em pacientes periodontais.
Clique abaixo e acesse o estudo original:
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