“Estava bom quando era só fosfato de zinco...daí, chegou o ionômero, muito legal para o lance da cárie... e então veio o tal de cimento resinoso para...complicar”. Quem não ouviu essa frase nos corredores das universidades ou dos cursos não viveu os últimos 20 anos de profissão!
O leitor e a leitora deste blog sabem o que é fazer "adesão" na clínica: atenção, cuidado e delicadeza. Prenda a respiração e solte devagar! Não tem outra receita.
Minto: tem sim, aquela que vem na bula: faça isso, não faça aquilo, etc. No laboratório, as orientações são da mesma natureza: façam isso, não façam aquilo.
Estamos falando de adesão, em especial, à zircônia (óxido de zircônio). Este material que hoje pode ser monolítico ou servir como infraestrutura em restaurações e tem porcentagens variadas de Y2O3 como material dopante (3%, 5%, 8%) dependendo da sua aplicabilidade (estrutural ou estética).
Voltando à adesão, o ponto é: se existem diversos protocolos para adesão à zircônia, será que existe algum que funciona melhor? Ou, será que algum deles dura mais? Saliva, sangue, enzimas e outros fluidos são fatores limitantes, sem falar na variabilidades dos protocolos para tratar a superfície.
Mas qual silano, adesivo, jateamento? Tudo junto e misturado? Qual protocolo de adesão à zircônia é mais efetivo?
Então, vamos à revisão sistemática mais recente, que conseguiu extrair simplesmente 77 estudos de mais de 8000 referências, colocando-os numa meta análise, ou melhor, em várias.
Estamos falando do momento do "boom" (anos 2000) até 2023, sendo apenas estudos in vitro, contendo grupos de tratamento e controle, com testes de tração e cisalhamento, relatando as médias e o desvio padrão das resistências adesivas (em MPa).
Bem, muita calma nessa hora. Primeiro, vamos aos possíveis tratamentos de superfície:
controle
jato de ar abrasivo
cobertura com sílica
condicionamento por infiltração seletiva
laser
condicionamento com solução à quente
plasma de gases
Segundo, aos componentes comuns nos primers e nos cimentos resinosos:
controle
10-MDP
outros monômeros acídicos (que não o 10-MDP)
silano
HEMA
silano + 10-MDP
silano + outros monômeros acídicos
HEMA+ 10-MDP
silano + HEMA + 10-MDP
silano + HEMA+ outros monômeros acídicos
silano + HEMA
Como são apenas testes laboratoriais, os de macro cisalhamento foram os mais frequentes (60%). Aquele quadradinho, disquinho ou bolachinha, onde o "recheio" contém tratamento de superfície. Por outro lado, o número de testes de micro tração (o famoso palitinho) ainda é pequeno.
Com relação aos tratamentos de superfície, o jato de ar lidera o ranking (54 artigos), seguido pela cobertura com sílica, laser, plasma de gases e condicionamento com solução à quente.
Por fim, as combinações mais frequentes entre os componentes de primers e cimentos resinosos foram o “silano + 10-MDP” e “HEMA +10-MDP”.
Atenção: o risco de vieses foi considerado de médio a alto, com menos de 4% dos estudos relatando como calcularam ou randomizaram suas amostras. Fato preocupante.
Com relação aos tratamentos de superfície, todos foram mais efetivos que o controle, tanto nas condições imediatas quanto envelhecidas, exceto pelo plasma de gases.
Com relação aos componentes dos tratamentos de superfície, aqueles contendo 10-MDP (10-MDP (10-MDP, silano + 10-MDP, HEMA + 10-MDP, silano + HEMA + 10-MDP) foram os mais efetivos na adesão à zircônia. O 10-MDP no primer ou no agente cimentante ultrapassa o desempenho dos outros monômeros acídicos no quesito resistência adesiva.
O jateamento de ar abrasivo com partículas menores (25-53 micrometros) foi mais efetivo do que o jateamento com partículas maiores (110-150 micrometros) no curto prazo, mas sem diferenças no longo prazo.
Rocatec Soft e Plus mostraram-se superiores ao Cojet, mas os dois primeiros não são diferentes entre si, tanto na condição inicial quanto envelhecida.
Fato importante: todos os valores de resistência adesiva caíram com o envelhecimento artificial. Entretanto, essa tendência pode ser mitigada pelo jateamento e cobertura com sílica.
E a última observação: futuros experimentos sobre adesão à zircônia deveriam ter uma padronização de suas metodologias (o grau de inconsistências nas meta análises é alto), o que permitirá uma extrapolação melhor para novos estudos clínicos.
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